segunda-feira, 20 de abril de 2015

TANGENDO A DOR

Seu Edilsinho é uma pessoa bem interessante. Muitas vezes me surpreendo com a forma com a qual encara, explica e se relaciona com o mundo. É como se fosse feito de uma matéria bem antiga, e sua pele idosa, marcada pelo tempo, a casca de uma árvore já sofrida pela ação das intempéries. Uma árvore ali, no meio dos caminhos que o povo estabeleceu secularmente para a facilidade dos transportes.

Foi assim que na última consulta ele me explicou algo a respeito de certa medicação anti-inflamatória que ele se automedicou, referindo-se à Nimesulida.
“O remédio né pa sará não, é pra tanger. A dor do espinhaço foi pras perna. Ela não sarou foi tangida pras perna”.

Para ele a dor ou a doença, ele se diagnosticou com reumatismo, é como gado, tem uma percepção destes fenômenos como sendo eles elementos vivos, materiais... Ele comenta coisas a respeito do seu suposto ou real reumatismo como se estivesse dizendo de uma pessoa com suas características de personalidade peculiares.

Indago e indago, pergunto várias vezes a ver se penetro o sentido desta alma, feita de pedra e lodo, organizada de um modo ancestral laborado em um tempo onde a chuva era mais frequente e as mães viam sua prole desaparecer na névoa de um tempo muito duro, onde os mitos que organizavam a existência, assim me parece, escapavam o comum dos demais lugares, tal o isolamento em que nasceram.


Recebam um abraço mítico de Aureo Augusto.

4 comentários:

  1. Cabe até meditar, pra descobrir até que ponto seu Edilsinho tem razão.
    Afinal, a dor é parceira da humanidade desde sua origem, já é cidadã e
    tem carteira de identidade e CPF. Por que a exclusão?
    E, realmente, não é incomum a dor migrar após uma medicação,
    mesmo ministrada por um profissional.
    Ela parece ter vontade própria.
    Abraço ancestral.

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    1. Razão não lhe falta em seu comentário.
      E, mtas vezes a verdade se mostra com uma linguagem não científica, mas real.
      Grato e abraço.

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  2. Oi, Áureo,

    Peço licença e vou entrando nesta casa, com as minhas palavras, hoje (até então só meus olhos passearam pelos textos). Preciso muito agradecer a você, pois seus textos têm me ajudado bastante e de diversas formas.

    Sobre o tema do texto, lembro tive dores que sumiram, outras que diminuíram e também tive dores que mudaram de lugar, tal qual Seu Edilsinho. Algumas começaram quando eu era bem jovem e outras parecem que são até mais antigas que eu mesma. No entanto, descobri alegrias enormes e pessoas especiais também me descobriram, como num carrossel, girando e trazendo a novidade: boa ou ruim, revelando que o desafio não é somente superar a dor ou temer perder a a alegria, mas lidar com a impermanência.
    Obrigada pelo exercício de reflexão propiciado pelos seus escritos,
    J.

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    1. Eu é que fico grato com sua reflexão.
      Parece que nesta vida a regra é que mais vale a nossa resposta aos desafios do que os desafios em si.
      Receba um abraço

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